O histórico prédio da Prefeitura de Tutoia, fica situado ao lado do prédio da Câmara de Vereadores, outro prédio histórico, na Praça Getúlio Vargas, abriga atualmente o Gabinete do Prefeito e a Secretaria de Administração e Planejamento. Trata-se de uma construção no estilo colonial portuguesa do tipo sobrado, em pedra e cal, iniciada e concluída na primeira metade do século XX, o que o torna um dos edifícios mais antigos da cidade. Desde sua construção até os dias atuais passou por reformas que alteraram sua fachada frontal, incluindo a construção de uma mureta, e também na parte interna.
Para Oliveira (1987) e Cantanhêde (2005), Euclides Neves construiu o primeiro prédio da prefeitura com material simples: em madeira, barro e palha, muito comum a época, mas a construção não resistiu a um vendaval que o demoliu totalmente. O mandatário então tratou de iniciar um novo prédio em pedra e cal. Seu mandato, segundo Oliveira (1987), se deu entre os anos 1919 e 1930, posto que em 01.10.1930, quem assumiu o governo de Tutoia, nomeado, foi Celso Gomes da Fonseca, tendo permanecido até 29.11.1945. Ele foi nomeado na época da “Revolução de 30”, comandada por Getúlio Vargas ao assumir como presidente do Brasil adotando medidas que modificaram o comando dos municípios. Em Tutoia, o movimento afetou o coronel Paulino Neves e seu aliado, o então prefeito Euclides Neves, pois, a revolução varguista colocou Celso Fonseca no poder, através de nomeação do governador, e afastou bruscamente Euclides (Oliveira, 1987).
Ainda, segundo a professora Bernarda Cantanhede (2005), Celso Fonseca, natural de Granja (CE), veio para Tutoia a convite do coronel Paulino Neves para trabalhar nas salinas, e acabou sendo nomeado prefeito interventor e governou o município por 15 anos, corroborando com as anotações de Oliveira (1987). Ao passo que Euclides, era genro do coronel Paulino Neves (Kruel, 2023). Celso Fonseca deu continuidade à construção iniciada pelo antecessor Euclides Neves. Para financiar a construção do prédio, Celso Fonseca teria requerido as verbas para subsidiar a construção do prédio ao então governador do estado do Maranhão Sebastião Archer, que fora prontamente atendido, e ao final teriam sobrados 4 ou 5 réis; Fonseca tomou um navio no porto de Tutoia com destino a São Luís levando o recurso que sobrou para devolvê-lo ao governador, cujo gesto foi entendido como de grande honestidade, mas este lho devolveu para que empregasse em nova obra em Tutoia.
Na parte interna, a escada que dá acesso ao piso superior, no corrimão havia uma serpente, que, conforme anotou o escritor Kenard Kruel, “foi decapitada na segunda administração do prefeito Egídio Francisco Conceição Júnior (1.1.1997 a 1.1.2005). A cabeça da mesma era um belíssimo trabalho do mestre Francisco Moraes, com dois olhos de rubis e um olhar de mais de meio século direcionado para a Praça Getúlio Vargas, centro da cidade. Até os dias atuais sem se ter notícia de quem foi o autor da decapitação. Dizem que a serpente se encantou e habita as árvores da Praça. À noite, vira uma linda donzela para namorar os jovens que por ali passam” (Kruel, 2023).
O prédio guarda as características arquitetônicas da Era Vargas (1930–1945) e Estado Novo (1937–1945), quando houve forte centralização do poder e ênfase em obras públicas e modernização administrativa. Mesmo quando a linguagem modernista começava a aparecer, muitas prefeituras e prédios administrativos construídos ou reformados nessa época mantiveram traços neoclássicos e ecléticos — fachadas simétricas, platibandas -, como é o caso desse de Tutoia.
A fachada com uma varanda no piso superior foi utilizada para pronunciamentos. A inscrição em relevo “PREFEITURA MUNICIPAL” reforça a função pública e cívica. O prédio imponente na Praça Getúlio Vargas, além de abrigo administrativo, foi palco de cerimônias, hasteamento de bandeiras, manifestações cívicas e registros públicos. Um dos mais destacados e grande intelectual que fora prefeito desta cidade, o advogado e jornalista Merval Melo, era adepto de fazer discursos da calçada da prefeitura, fosse nas datas cívicas, posses ou eventos especiais. Merval Melo foi prefeito de Tutoia em duas ocasiões: de 1977 a 1983 e de 1989 a 1992.
O prédio é do tipo alvenaria de tijolo rústico e reboco com acabamentos em estuque ou molduras simples nas aberturas, a laje do piso superior é de madeira, as portas e janelas em esquadrias em madeira, muitas vezes pintadas em cor contrastante de marrom e bege, em desenhos geométricos simples, guardando simetria, notados nos vãos das janelas e portas, o que se alinha também com a estética da arquitetura neoclássica europeia. Boa parte do material de construção e ornamentação do prédio veio da Europa da capital do Brasil, - à época -, o Rio de Janeiro, trazidos em navios que tocavam o porto de Tutoia, quando a cidade se destacava como importante porto do país, recebendo embarcações nacionais e estrangeiras (das linhas para a Europa e Estados Unidos).
À esquerda, do acervo da Biblioteca do IBGE (s.d., autor desconhecido). À direita, do acervo de Elivaldo Ramos Lima (imagem feita em 6 de julho de 2022).
OUTROS PRÉDIOS DA PRAÇA GETÚLIO VARGAS
CASA DE ZELINDA NEVES MIRANDA
A Praça Getúlio Vargas continua a ser um marco das mudanças, abrigando memórias e expectativas futuras, o que se confirma com imagens aéreas feitas nos dias atuais, em comparação com imagens do passado (fins do século XIX e início do século XX), é visível a transformação ocorrida ao longo dos anos. No local onde ficava a casa da professora Zelinda Neves, por exemplo, atualmente há pontos comerciais. A residência, que possuía um relógio de sol no terraço principal, foi demolida nos anos 2010 para dar lugar a novas construções, refletindo o avanço urbano. No entanto, a lembrança da casa e da professora Zelinda ainda é preservada na memória da cidade, simbolizando a história local.
Zelinda Neves Miranda, era filha do Coronel Paulino Neves e Zuza Neves; nasceu em 10 de novembro de 1907, sendo a segunda filha do Coronel nascida em Tutóia. Aos 14 anos, mudou-se para São Luís, onde estudou no colégio "Maria Auxiliadora" das irmãs Dorotéia, completando sua formação como professora. Ao voltar para Tutóia, iniciou sua carreira lecionando na casa de seus pais, conhecida como o Chalé (prédio histórico pertencente à Diocese de Brejo, situado na Avenida Paulino Neves).
Além de sua atuação como educadora, Zelinda Neves foi secretária de educação do município durante o governo de Zilmar Melo na década de 1970. Sua dedicação à educação teve um impacto significativo na comunidade. Zelinda Neves faleceu em 28 de agosto de 2004, deixando um legado de conhecimento e serviço para Tutóia.
MESA DE RENDAS
Outro prédio de grande importância na Tutoia do período de grande atividade portuária, era a disputadíssima Mesa de Rendas Federal, estava localizada em frente à Praça Getúlio Vargas, onde residiam os administradores. Na mesma região, na Rua Senador Leite, bem próxima à praça, viviam Naíza Neves e Dácio Neves, irmãos de Zelinda Neves, todos filhos do coronel Paulino Neves. Além deles, também residia nas proximidades, o Coronel Arthur Athayde, na casa que nos dias de hoje abriga o Colégio Presidente Castelo Branco.
PRAÇA GETÚLIO VARGAS
A Praça Getúlio Vargas, descrita pelo escritor Kenard Kruel, é um ícone de Tutoia, cercada por prédios históricos como a Igreja Matriz de Nossa Senhora de Nazaré, a Câmara Municipal e a Prefeitura de Tutoia, além de lojas tradicionais. Nos últimos anos, aos sábados, das 17h às 22h, a praça ganha vida com a Feirinha Meus Teréns, organizada pelo músico e professor Severino Santos.
A praça é marcada pela residência de Zelinda Neves, onde se destaca o relógio do sol. Também são notáveis as residências de Lucas Cardoso Veras e sua esposa Maria Ibiapina Veras, conhecida como Cotinha Veras. Maria Ibiapina Veras era filha de Antônio Pereira Ibiapina e irmã de Antônio Pereira Ibiapina Filho, que trabalhava na casa comercial de M. A. Barros & C. em São Luís. Zina de Caldas Ibiapina, outra irmã, faleceu em Parnaíba em 1919.
Além disso, a praça é associada a Mário Brandão de Medeiros, esposo da professora Terezinha Medeiros, e ainda Geovane Oliveira, da Farmácia Santo Onofre, e Jesus Oliveira, proprietária da farmácia que atualmente pertence ao seu neto Daniel Castelo Branco.
Na lateral direita da Praça Getúlio Vargas, a rua Celso Fonseca era transitável por pessoas e veículos. De fronte para a praça, ainda há residências com traços arquitetônicos antigos onde moravam pessoas mais influentes e abastadas da cidade, entre elas o ex-agente da empresa de navegação Loyde Brasileiro e que também foi prefeito, o sr. Lucas Veras (foto abaixo). Este prédio durante muitos anos foi a sede da Previdência Social (INSS).
Fonte: Elivaldo Ramos, 2023.
Na Rua Senador Leite haviam muitas árvores, ou melhor as figueiras, que foram cortadas na administração do Prefeito José Matos Silva, em virtude de uma invasão de um inseto chamado “lacerdinha”, em referência a Carlos Lacerda, uma praga que foi registrada, na época, em diversas partes do nosso país, segundo o professor Antonio Gallas (2024). Ele afirmou ainda que na rua Senador Leite e Avenida Paulino Neves havia várias dessas árvores. Veja a Imagem do acervo do professor Euges Lima.
Por fim, a área abriga históricos prédios que passaram a ser símbolos da Praça Getúlio Vargas. Na década de 80, a programação da Rede Globo e do SBT passou a ser retransmitida em Tutoia com a implantação de torres de retransmissão de televisão mantidas pela prefeitura municipal. E uma Tv para o público foi colocada na frente do prédio. O radialista Hamilton Tavares (2024) lembra que em 1987, quando chegou em Tutoia, “já havia uma torre de TV no quintal da prefeitura, com uma placa identificando TV Tutoia CANAL 10, tendo como Secretário Municipal de Comunicação o saudoso Zé Melo". Para administração do serviço da televisão instalada da praça Getúlio Vargas, tinha um encarregado que a ligava todas as noites, atraindo uma multidão que se reunia para assistir telejornais e novelas; àquela época eram raras as tvs nas residências, visto que somente pessoas mais abastadas as possuíam. A tv era ligada, geralmente, às 18h e desligada às 22h.
Praça Getúlio Vargas, da boa gente, ordeira e trabalhadora de Tutoia Nova.
BIBLIOGRAFIA
CANTANHÊDE, Bernarda. Conheça Tutoia: geografia e história. São Luís-MA: Gráfica de Editora Tema, 2005.
KRUEL, Kenard. A serpente da Prefeitura de Tutoia, in: https://elivaldoramos.blogspot.com/2023/01/a-serpente-da-prefeitura-de-tutoia.html. Acesso em 12 de agosto de 2025.
KRUEL, Kenard. RAMOS, Elivaldo. PREFEITOS DE TUTOIA: Euclides Gomes Neves, terá sido o primeiro?, in: https://elivaldoramos.blogspot.com/2022/03/euclides-neves-na-praca-getulio-vargas.html. Acesso em 12 de agosto de 2025.
OLIVEIRA, Paulo. Panorama Histórico e Geográfico de Tutoia e Araioses. São Luís, 1987.
Artigo escrito por Elivaldo Ramos Lima, em 12 de agosto de 2025.
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[1] Na obra Panorama histórico de Tutoia e Araioses, edição do ano 1987, do autor Paulo Oliveira.
[2] Publicação do blog elivaldoramos.com, em 2023.
[4] "Carlos Lacerda foi um jornalista e político brasileiro extremamente popular nas décadas de 1950 e 1960. Comunista em sua juventude, ele se tornou ultraconservador e um dos grandes nomes da União Democrática Nacional (UDN) durante o período democrático que existiu no Brasil entre 1946 e 1964. Foi também um forte defensor do golpismo e articulou golpes no Brasil em 1954, 1955, 1961 e 1964." Veja mais sobre "Carlos Lacerda" em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/carlos-lacerda.htm. Acesso em 14 de out. 2024. Veja também a matéria do portal G1 em: https://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2024/01/22/lacerdinhas-infestam-praias-no-litoral-de-sp-e-causam-coceira-e-irritacao-em-banhistas.ghtml, que traz uma matéria sobre o inseto: “Lacerdinhas infestam praias no litoral de SP e causam coceira e irritação em banhistas. A presença de um inseto incomum na faixa areia de algumas praias da Baixada Santista, no litoral de São Paulo, está assustando os banhistas. O biólogo Eric Comin analisou imagens enviadas pelo g1 e explicou se tratar de uma praga conhecida por lacerdinha ou tripes (Gynaikothrips sp) que, segundo ele, provoca coceira e pode causar grandes estragos em alguns tipos de plantas”. Acesso em 14 de out. 2024.
[5] Depoimento ao autor, no ano de 2024.
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