Autora: FÁTIMA MIRANDA
GGN - Circula na Internet um vídeo editado de palestra que proferi no
mês passado em um evento em São Paulo. O vídeo é fiel ao que eu disse. Mas o
título e o texto podem induzir a conclusões taxativas que não fiz ou passar a
ideia de que o vídeo faz parte dessas guerrilhas que ocorrem periodicamente em
redes sociais. As informações foram divulgadas em 2014 e 2015. Estão sendo
agitadas agora.
O trecho em questão faz parte
de um seminário no mês passado, do qual participei com a colega Helena Chagas
Limitei-me a apontar
indícios, indícios fortes, sem dúvida, que merecem ser investigados, mas não
acusações frontais.
A história é a seguinte.
Historicamente, as APAEs
(Associações de País e Amigos de Excepcionais) fizeram-se contando, na ponta,
com cidadãos bem intencionados, mas passando a trabalhar com recursos públicos,
sem prestar contas para os órgãos formais de controle.
Essas liberalidades abriram
espaço para desvios e uma utilização política da estrutura das APAEs, através
da Confederação e das Federações estaduais de APAEs, incluindo a do Paraná.
Na sua gestão, o ex-Ministro
da Educação Fernando Haddad decidiu assumir a tese da educação inclusiva –
segundo a qual, o melhor local para desenvolvimento de crianças com
necessidades especiais seria as escolas convencionais, convivendo com crianças
sem problemas.
Sabendo da resistência que
seria feita pelas APAEs – já que a segregação de crianças com deficiência,
apesar de tão anacrônica quanto os antigos asilos para tuberculoses, é o seu negócio
– Haddad pensou em um modelo de dupla matrícula: a escola pública que acolhesse
um aluno com deficiência receberia 1,3 vezes o valor original da matrícula; e
uma segunda matrícula de 1,3 se houvesse um projeto pedagógico específico para
aquela criança. Imaginava-se que essa parcela seria destinada à APAE de cada
cidade, atraindo-a para os esforços de educação inclusiva.
Aqui, o que falei sobre o
tema, não editado.
As APAEs mais sérias, como a
de São Paulo, aderiram rapidamente ao projeto, sabendo que a educação inclusiva
é pedagogicamente muito superior ao confinamento das pessoas, tratadas como
animais.
O jogo das Federações de
APAES foi escandaloso. Trataram de pressionar o Congresso para elas próprias
ficarem com as duas matrículas, preservando o modelo original.
O ápice desse jogo é a
proposta do inacreditável senador Romário, nesses tempos de leilão escancarado
de recursos públicos, visando canalizar para as APAEs e Institutos Pestalozzi
todos os recursos da educação inclusiva.
É um jogo tão pesado que, na
época da votação do Plano Nacional da Educação, a própria Dilma Rousseff
pressionou senadores a abrandar a Meta 4, que tratava justamente da educação
inclusiva, com receio de que as APAEs do Paraná boicotassem a candidatura da então
Ministra-Chefe da Casa Civil Gleise Hoffmann.
O caso do Paraná
Comecei a acompanhar o tema
através da procuradora da República Eugênia Gonzaga, uma das pioneiras da luta
pela educação inclusiva.
Em 2002, Eugenia levantou
princípios constitucionais - do direito à educação - para forçar o poder
público a preparar a rede para crianças com deficiência. Na ocasião, foi alvo
de 3.500 ações judiciais de APAEs de todo o país.
No auge da pressão política
das APAEs, ainda no governo Dilma, decidi investigar o tema.
As APAEs tem dois lobistas
temíveis. A face "boa" é a do ex-senador Flávio Arns, do Paraná; a
agressiva de Eduardo Barbosa, mineiro, ex-presidente da Federação das APAEs,
que pavimentou sua carreira política com recursos das APAEs.
Uma consulta ao site da
Secretaria da Educação do Paraná confirmou o extraordinário poder de lobby das
APAEs. O então Secretário de Educação Flávio Arns direcionou R$ 450 milhões do
estado para as APAEs, com o objetivo de enfrentar a melhoria do ensino inclusivo
da rede federal.
No próprio site havia uma
relação de APAEs. Escolhi aleatoriamente uma delas, Nova California.
Indo ao seu site constatei
que tinha um clube social, com capacidade para 2.500 ou 4.500 pessoas; uma
escola particular. Tudo em cima das isenções fiscais e dos repasses públicos
dos governos federal e estadual.
O argumento era o de que o
clube era local para os professores poderem confraternizar com a comunidade; e
a escola privada para permitir aos alunos com necessidades especiais conviverem
com os demais.
Telefonei para a escola. Não
havia ninguém da direção. Atendeu uma senhora da cozinha. Indaguei como era o
contato dos alunos com deficiência e os da escola convencional. Respondeu-me
que havia um encontro entre eles, uma vez por ano.
A república dos Arns
As matérias sobre as APAEs,
especialmente sobre o caso Paraná, tiveram desdobramentos. Um dos comentários
postados mencionava o controle das ações das APAEs do estado pelo escritório de
um sobrinho de Flávio, Marlus Arns.
Entrei no site do Tribunal de
Justiça. Praticamente toda a ação envolvendo as APAEs tinha na defesa o
escritório de Marlus.
Uma pesquisa pelo Google
mostrou um advogado polêmico, envolvido em rolos políticos com a Copel e outras
estatais paranaenses, obviamente graças à influência política do seu tio Flávio
Arns.
Quando a Lava Jato ganha
corpo, as notícias da época falavam da esposa de Sérgio Moro. E foi divulgada a
informação de que pertencia ao jurídico da Federação das APAEs do estado.
Por si, não significava nada.
No entanto, logo depois veio
a dica de um curso de direito à distância, de propriedade de outro sobrinho de
Flávio Arns, irmão de Marlus, o Cursos Online Luiz Carlos (http://www.cursoluizcarlos.com.br)..
No corpo docente do cursinho, pelo menos um da força tarefa da Lava Jato.
Finalmente, quando Beatriz
Catta Preta desistiu de participar dos acordos de delação, um novo elo
apareceu. Até hoje não se sabe o que levou Catta Preta a ser tão bem sucedida
nesse mercado milionário. Nem o que a levou a sair do Brasil.Mas, saindo, seu
lugar passou a ser ocupado justamente por Marlus Arns que, pouco tempo antes,
escrevera artigos condenando o instituto da delação premiada.
Sâo esses os elementos de que disponho.
Recentemente, fui convidado
pela Polícia Federal para um depoimento em um inquérito que apura um suposto dossiê
criado pela inteligência da PF supostamente para detonar com a Lava Jato –
conforme acusações veiculadas pela Veja.
Fui informado sobre o dossiê
na hora do depoimento. Indagaram se eu tinha tomado conhecimento das
informações.
Informei que o dossiê tinha
se limitado a reproduzir os artigos que escrevi acerca da República dos Arns.
Fonte: http://verdadesoccultas.blogspot.com.br/2017/04/mulher-de-moro-tem-nome-ligado-esquema.html
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