REMINISCÊNCIAS: TUTOIA, CIDADE DO MEU CORAÇÃO

Escrever assim pode parecer clichê, mas achei tão lindo o texto do Presidente Sarney sobre sua São Luís: “Ainda uma vez São Luís”, que humildemente lhe peço emprestado para adaptar à minha cidade, a cidade do meu coração, que formou a minha vida: esta velha e jovem Tutoia, que faz aniversário nesta sexta-feira Santa, 29 de março do ano de 2024.  

Minha paixão por Tutoia começou quando aqui cheguei vindo do meu povoado natalício, Bezerro, no lombo de um cavalo, levado por minha mãe, a Célia Ramos, que mesmo chorando por dentro por deixar um filho pequeno na cidade, queria me ver formado. Eu tinha sete anos. De longe, ao alvorecer, vi o movimento da cidade. Bela. Desapeei na impressão da multiplicidade das coisas: carroças, sacos, paneiros, peixes, gentes. E das lanchas no porto. Nunca tinha visto um sobrado, ruas estreitas, a rua da pedra levando o casario para o porto, as nuvens que desenhavam anjos no céu levadas pelos ventos alísios. Saudade dos invernos de minha infância, da relva verdinha, do matapaste; a água desabando nos beirais, entrando pelas janelas com o vento, molhando a cidade. 

Mesmo estando aqui em Tutoia a saudade não passa. Aqui morei na rua Lucas Veras, na Avenida Paulino Neves, acolhido pelas mãos generosas de minha madrinha Conceição Matos (minha segunda mãe), do Tio Biná e Maria Alzira, de tia Madá, de seu Adonias e Dona Nazinha. Sinto saudade das brincadeiras nas ruas de areia, ou nas dunas, no igarapé, na prainha, com meus amigos e meus primos. Sempre me vejo trabalhando nos empreendimentos do seu Crizan Reis e Dona Lindalva Neris, na locução das rádios ou andando pelas ruas da cidade velha, numa peregrinação de amor.  

Esta cidade foi também para o coronel Paulino Neves o local que escolheu para a Tutoia Nova, em que viveu seus únicos dias de intensa e real felicidade: os anos de 1892 a 1930, ofertou a felicidade a Dona Zuza no Chalet e construiu um porto seguro, próspero porto Salinas, e os dias glória, de festa, de prosperidade. O resto de sua vida, antes e depois, foi uma longa saudade. Padre João Tavares, aldeou os Teremembés no sítio Mayrim dos Índios. 

Eu pertenço à geração que mais amou Tutoia. Todos lhe fizemos versos de uma paixão de adolescente, forte e extasiante. Almeida Galhardo o poeta das Gaivotas, “gaivotas do azul, veleiros do infinito”. Elza deixou versos que hoje são o seu hino, “nós mora lá na Tutoia, cidade do beira mar”. Ananias Santos, o pai do nosso artesanato, ideário do Boi Pelado. Antonio José Neves Rodrigues, pai do nosso arraial, este se derreteu todo e com ela criou uma cumplicidade de “tudo é festa”. Zé Carlos Ramos, pesquisador fervoroso. Nonato Freitas, e a “Aquarela de Minha Terra”. Padre Jocy Neves, autor do Hino de Tutoia, essa “filha do amor dos santos missionários”. Janete Lucíola, a musa do rádio; Adriele, a melhor do mundo do beach soccer; Professora Perosé, Bernarda Cantanhede, Suzana Alves, Popy, Giovani, Jacques, Paulinho, Bobô, Datinha, Eudim, Cazuza, Odorico Melo Araujo, Paulo Oliveira, Merval Melo, Zilmar Melo, Lucas Veras, Antonio Gallas Pimentel, Abdon de Andrade, Edilson Caldas, Seu Madruga, Chico Caema, Valdemar do Bom Gosto, Pezinho, Pedro da Jardilina, Branco Bond, Ribamar Veras, Teco Teco, Rita e Flavio Merequeta, Egídio Júnior, Agostinho Barbosa Neto, Padre Hélio Maranhão, o desbravador, com ele nasceram as CEBs nas brancas areias de Tutoia. Todos fomos seus amantes. 

Tutoia é poesia e cravo. Poesia do nosso chão, cravo perfumado do nosso amor. Um lençol de areias beijando o mar que se derrama numa ondulação suave, em praias e ilhas belas. Corre um vento azul turquesa que vem d’além mar com cheiro de maresia e sal. Passam fantasmas, fontes de rios e riachos, casas de forno, casas de pescador e pescaria. Ouço o silêncio da noite nas lendas de assombração e das redes que saem do mar, com cheiro de peixe e camarão, do kitesurfista do Arpoador que se encantou com as praias do meu torrão. Tutoia que adotou o Zé Paraibano que, nas bocas das noites, cantava minha terra e sua gente com sua viola.

Minha Tutoia, minha terra, minha paixão! 



Texto escrito em 29.03.2024.

Imagens: autores desconhecidos. Era assim a principal praça da cidade, a Getúlio Vargas, assim está na minha memória.



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